domingo, 29 de julho de 2007

VARAL VIRTUAL - OLIVEIRA SILVEIRA

MÃE-PRETA

Filho de branca babujou teu seio,
Negrinho berrou e berrou,
Sinhá nenhuma amamentou.
Por que não existe mãe-branca?
Por que não existe mãe-branca?
- Mãe branca?
Ora já se viu
É muito desaforo!

- “Roteiro dos Tantãs”



ENCONTREI MINHAS ORIGENS

Encontrei minhas origens
Em velhos arquivos
Livros
Encontrei
Em malditos objetos
Troncos e grilhetas
Encontrei minhas origens
No leste
No mar em imundos tumbeiros
Encontrei
Em doces palavras
Cantos
Em furiosos tambores
Ritos
Encontrei minhas origens
Na cor de minha pele
Nos lanhos de minha alma
Em mim
Em minha gente escura
Em meus heróis altivos
Encontrei
Encontrei-as enfim
Me encontrei

- em “Roteiro dos Tantãs”




CANTAR CHARQUEADA

Até eu cantei charqueada
Chorando a sorte do boi.
Mas descobri que meu canto
Tem raízes noutro campo:
Por trás das cancelas mudas,
Por trás das facas agudas.
Meu canto é uma carne escura
Charqueada a relho na nalga;
É figura seminua
Junto às gamelas de salga.
Carne escura exposta ao vento
Dos varais do saladeiro
Exposta viva ao sol quente
E suas facas carneadeiras.
Carne que se compra e vende
E de bem longe se importa
Se salga, seca e só perde
Quando já é carne morta
E meu canto é dessa carne
Que não é minha e me dói
Sangrando no sol da tarde
De um tempo que enfim se foi
Cabe a mim cantar charqueada
Chorando a sorte do boi?

- em “Pêlo Escuro”

Nenhum comentário: