segunda-feira, 30 de julho de 2007

VARAL VIRTUAL - MARCUS MINUZZI

O mar do indefinido (trecho)

Sonha comigo, fada boa e criativa.

Rebolas com devoramentos,
Numa atitude de esmagar o pinto.
Aquele homem já não sou.
Amassas meu pau como uva em vinho,
Como milho em pão.
Queres esta glúten,
Para fazer novos pintos,
Dentro de um ovo.
Vários novos mitos meus cabelos irão colorir,
Mitos de arrastar os pés, juntos,
Em lendas sexualizadas, faces obscuras,
Que ninguém entende, apenas ama.
Amor, morte e dúvida:
O maior telhado para nossos terreiros
Só pode ser esta nave indefinida.
Amor de marinheiro.
Sou mistério, Dora, moça bonita,
Mas tenho cristos em meu caminho,
Um maracatu angélico e preciso.
Veloz diamante me pintou sagrado e inatingível,
Guardado em segredo dentro da vagina.
Meu beijo de rã caída e sem máscara verde
Pousará a cruz sobre tuas
Minas inesgotáveis
De sabedoria.

VARAL VIRTUAL - JOSÉ EDUARDO DEGRAZIA

DISCÍPULOS DE EROS

Os namorados
são transparentes
quando olhados
de frente
de lado
de perto
ou distante
são diamantes
amantes, amantes
amantes
dão-se as mãos
simplesmente
mentes e olhos
mentem versos
verdades várias
vôos
são pássaros
são peixes
imersos no mar
do amor
esquecidos
de tudo
de nada
de todos
jogam dados
do destino
cantam hinos
são apenas
lábios, lábias
sedução
sábios e vivos
inocentes
e meninos
enquanto amor
os domina
e ilumina.


A HORA CERTA

Quando não se puder
mais olhar uma flor,
quando não se puder
mais amar uma mulher,
quando o mundo for
só aparência de ser
e não permitir alegria,
é a hora certa de plantar,
é a hora certa de cantar,
é a hora certa de amar
é a hora certa de ver,
é a hora certa de viver,
é a hora certa de colher,
a manhã sempre vem,
o amor pode voltar
pra te dizer que a vida
vale a pena ser vivida.

É a hora certa de plantar,
é a hora certa de cantar,
é a hora certa de amar,
é a hora certa de ver,
é a hora certa de viver,
é a hora certa de colher.



- José Eduardo Degrazia nasceu em Porto Alegre em 1951.

Publicou dezenas de artigos e crônicas em jonais e revistas do Brasil e do exterior.
Tem publicados os livros de poemas, Lavra permanente, Cidade submersa, A porta do sol, Piano arcano, e A urna Guarani; seus livros de contos são: O atleta recordista, A orelha do bugre, A terra sem males, e Os leões selvagens de Tanganica; recentemente saiu sua novela O reino de macambira.
Traduziu livros de Pablo Neruda, poetas latino-americanos e italianos.
Foi premiado em poesia, conto, teatro e tradução.

domingo, 29 de julho de 2007

OLIVEIRA SILVEIRA por Oliveira Ferreira da Silveira



OLIVEIRA SILVEIRA (Oliveira Ferreira da Silveira)

– Poeta negro brasileiro, nascido em 1941 na área rural de Rosário do Sul, Estado do Rio Grande do Sul. Filho de Felisberto Martins Silveira, branco brasileiro de pais uruguaios, e de Anair Ferreira da Silveira, negra brasileira de cor preta, de pai e mãe negros gaúchos. Graduado em Letras – Português e Francês com as respectivas Literaturas – pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS. Docente de português e literatura no ensino médio. Atividades jornalísticas. Ativista do Movimento Negro. Um dos criadores do Grupo Palmares, de Porto Alegre. Estudou a data e sugeriu a evocação do 20 de Novembro, lançada e implantada no Brasil pelo Grupo Palmares a contar de 1971, tornando-se Dia Nacional da Consciência Negra em 1978, denominação proposta pelo Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial, MNUCDR. Como escritor, publicou até 2005 dez títulos individuais de poesia – Pêlo escuro, Roteiro dos tantãs, Poema sobre Palmares, entre outros – e participou de antologias e coletâneas no país e no exterior: Cadernos negros, do grupo Quilombhoje, e A razão da chama, de Oswaldo de Camargo, em São Paulo-SP; Quilombo de Palavras, organização de Jônatas Conceição e Lindinalva Barbosa, em Salvador, na Bahia; Schwarze poesie/Poesia negra e Schwarze prosa/Prosa negra, organizadas por Moema Parente Augel e editadas na Alemanha por Édition diá em 1988 e 1993, com tradução de Johannes Augel; ou revista Callaloo volume 18, número 4, 1995, e volume 20, número 1 (estudo de Steven F. White), 1997, Virgínia, Estados Unidos. Na imprensa, publicou artigos, reportagens, e alguns contos e crônicas. Participou com artigos ou ensaios em obras coletivas, caso do ensaio Vinte de novembro: história e conteúdo, no livro Educação e Ações Afirmativas, organizado por Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva e Válter Roberto Silvério – Brasília: Ministério da Educação/Inep, 2002. Entre algumas distinções recebidas: menção honrosa da União Brasileira de Escritores, do Rio de Janeiro, pelo livro Banzo Saudade Negra em 1969; medalha cidade de Porto Alegre, concedida pelo Executivo Municipal em 1988; medalha Mérito Cruz e Sousa, da Comissão Estadual para Celebração do Centenário de Morte de Cruz e Sousa – Florianópolis-SC, 1998; Troféu Zumbi, obra de Américo Souza, concedido pela Associação Satélite-Prontidão, da comunidade negra de Porto Alegre, 1999; Comenda Resistência Civil Escrava Anastácia, da Rua do Perdão, evento cultural negro, Porto Alegre, 1999; e Tesouro Vivo Afro-brasileiro, homenagem do II Congresso Brasileiro de Pesquisadores Negros, realizado entre 25 e 29 de agosto de 2002 na Universidade Federal de São Carlos, UFSCAR, em São Carlos-SP – ato em 27 de agosto. Atuação em outros grupos a contar de meados da década 1970: Razão Negra, Tição, Semba Arte Negra, Associação Negra de Cultura. Integrante da Comissão Gaúcha de Folclore. Conselheiro da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República – SEPPIR/PR, integrando, nesse órgão com status de ministério, o Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial – CNPIR, órgão consultivo, período 2004-2006. Alguns exercícios em texto teatral paradidático (cenas, montagens simples) e música popularesca. Poemas musicados por Haroldo Masi, Wado Barcellos, Aírton Pimentel, Luiz Wagner, Marco de Farias, Paulinho Romeu, Flávio Oliveira, Vera Lopes-NinaFóla, Lessandro e, na Suécia, pela compositora Tebogo Monnakgotla.

VARAL VIRTUAL - OLIVEIRA SILVEIRA

MÃE-PRETA

Filho de branca babujou teu seio,
Negrinho berrou e berrou,
Sinhá nenhuma amamentou.
Por que não existe mãe-branca?
Por que não existe mãe-branca?
- Mãe branca?
Ora já se viu
É muito desaforo!

- “Roteiro dos Tantãs”



ENCONTREI MINHAS ORIGENS

Encontrei minhas origens
Em velhos arquivos
Livros
Encontrei
Em malditos objetos
Troncos e grilhetas
Encontrei minhas origens
No leste
No mar em imundos tumbeiros
Encontrei
Em doces palavras
Cantos
Em furiosos tambores
Ritos
Encontrei minhas origens
Na cor de minha pele
Nos lanhos de minha alma
Em mim
Em minha gente escura
Em meus heróis altivos
Encontrei
Encontrei-as enfim
Me encontrei

- em “Roteiro dos Tantãs”




CANTAR CHARQUEADA

Até eu cantei charqueada
Chorando a sorte do boi.
Mas descobri que meu canto
Tem raízes noutro campo:
Por trás das cancelas mudas,
Por trás das facas agudas.
Meu canto é uma carne escura
Charqueada a relho na nalga;
É figura seminua
Junto às gamelas de salga.
Carne escura exposta ao vento
Dos varais do saladeiro
Exposta viva ao sol quente
E suas facas carneadeiras.
Carne que se compra e vende
E de bem longe se importa
Se salga, seca e só perde
Quando já é carne morta
E meu canto é dessa carne
Que não é minha e me dói
Sangrando no sol da tarde
De um tempo que enfim se foi
Cabe a mim cantar charqueada
Chorando a sorte do boi?

- em “Pêlo Escuro”

VARAL VIRTUAL - SOLANO TRINDADE


Gravata Colorida

Quando eu tiver bastante pão
para meus filhos
para minha amada
pros meus amigos
e pros meus vizinhos
quando eu tiver
livros para ler
então eu comprarei
uma gravata colorida
larga
bonita
e darei um laço perfeito
e ficarei mostrando
a minha gravata colorida
a todos os que gostam
de gente engravatada...


Sou Negro


Sou negro
meus avós foram queimados
pelo sol da África
minh'alma recebeu o batismo dos tambores
atabaques, gongôs e agogôs

Contaram-me que meus avós
vieram de Loanda
como mercadoria de baixo preço
plantaram cana pro senhor de engenho novo
e fundaram o primeiro Maracatu
Depois meu avô brigou como um danado
nas terras de Zumbi
Era valente como quê
Na capoeira ou na faca
escreveu não leu
o pau comeu
Não foi um pai João
humilde e manso

Mesmo vovó
não foi de brincadeira
Na guerra dos Malês
ela se destacou

Na minh'alma ficou
o samba
o batuque
o bamboleio
e o desejo de libertação


Negra bonita

Negra bonita de vestido azul e branco
Sentada num banco de segunda de trem
Negra bonita o que é que você tem?
Com a cara tão triste não sorri pra ninguém?

Negra bonita
É seu amor que não veio
Quem sabe se ainda vem
Quem sabe perdeu o trem
Negra bonita não fique triste não
Se seu amor não vier
Quem sabe se outro vem
Quando se perde um amor
Logo se encontra cem
Você uma negra bonita
Logo encontra outro bem.

Quem sabe se eu sirvo
Para ser o seu amor
Salvo se você não gosta
De gente da sua cor
Mas se gosta eu sou o tal
Que não perde pra ninguém
Sou o tipo ideal
Pra quem ficou sem o bem...


Quem tá gemendo?

Quem tá gemendo,
Negro ou carro de boi?
Carro de boi geme quando quer,
Negro, não,
Negro geme porque apanha,
Apanha pra não gemer...

Gemido de negro é cantiga,
Gemido de negro é poema...

Gemem na minh'alma,
A alma do Congo,
Da Niger, da Guiné,
De toda África enfim...
A alma da América...
A alma Universal...

Quem tá gemendo,
negro ou carro de boi?


- Solano Trindade nasceu em Recife (PE), em 24 de julho de 1908. Uma das figuras mais expressivas e admiráveis da poesia negra no Brasil. Filho de Manuel Abílio Trindade, sapateiro e cômico de profissão, e de dona Emerenciana de Jesus, quituteira e operária. Desde muito cedo acompanhava o pai em suas danças de pastoril e bumba-meu-boi, e isto despertou no menino um forte interesse pelo folclore, o teatro e a cultura popular. Fez o curso propedêutico da Academia de Comércio de Recife, foi operário e funcionário público federal, no início de sua carreira (Serviço Nacional de Recrutamento). Publicou Poemas de uma vida simples, 1944, Seis tempos de poesia, 1958, e Cantares de um povo, 1963, entre outros. Solano Trindade morreu no Rio de Janeiro em 1974, aos 66 anos.

sábado, 28 de julho de 2007

VARAL VIRTUAL - LARA DE LEMOS

Carrego versos.
O coração chega tarde
ao cais deserto.


- Lara de Lemos



quinta-feira, 26 de julho de 2007

A poeta Graça Carpes, do Rio de Janeiro,
virá participar do PORTOPOESIA,
com a apresentação do seu
RITUAL POÉTICO EM SEIS MOVIMENTOS.

VARAL VIRTUAL - GRAÇA CARPES



Amuleto para atrair prosperidade


use duas metades de uma
casca de
noz
dentro coloque sete sementes de
girassol
descascadas um
pedaço de canela em pau e
sete cravos da
Índia
cole um raio de sol
um brilho de lua
um pouco do povo das
ruas
(
que é para exercitar
a
compaixão
)
e muita
alegria
carregue
consigo é
ótimo para
presentear
amigos


- Graça Carpes (RJ) –

VARAL VIRTUAL - LUIS DILL

crepúsculo:
dentes de sombra
mastigam o dia

- Luis Dill


VARAL VIRTUAL - RITA APOENA

Sobre as conchas da mão

(para F)

Toma o amor guardado entre as conchas da minha mão. Dentro delas ouvi as ondas/
quebrando-se em pedras e o espetáculo de um pequeno musgo nascido à beira de um raio/
de sol. Dentro delas, ouvi a terra aninhando sementes e plantas entrelaçando a ponta de/
suas raízes. Finas raízes tentando sustentar o mundo sob as placas de cimento. As placas
de/
cimento, de onde germinam as casas e crescem as pessoas, entrelaçando a ponta de seus/
braços e o mais fundo de seus corpos pela noite escura. Dentro delas, ouvi o mundo inteiro/
tentando ser par... e ouvi a ponta de tuas asas tocando minhas costas nuas, teu instrumento/
de cordas e suspiros profundos.

quarta-feira, 25 de julho de 2007


VARAL VIRTUAL - BRUNO BRUM PAIVA

A rótula



Quarenta e cinco noites à espera
num mar revolto de idéias e arestas
como se definida estivesse
como se oriunda parecesse,
a invulgar anatomia de teus pensamentos.


segunda-feira, 23 de julho de 2007

O QUE É POESIA? - Pequena aventura/colagem ao redor da questão

A criança que brinca e o poeta que faz um poema estão ambos na mesma idade mágica. – Mario Quintana

A poesia ajuda a respirar bem. \ Os poetas nos ajudarão a descobrir em nós uma alegria tão expressiva ao contemplar as coisas que às vezes viveremos, diante de um objeto próximo, o engrandecimento de nosso espaço íntimo. \ Todo conhecimento da intimidade das coisas é imediatamente um poema. – Gaston Bachelard.

A poesia é uma arte da linguagem, certas combinações de palavras podem produzir uma emoção que outras não produzem, e que denominamos poética. – Paul Valery

Descobri com a minha filha de nove anos que a poesia é a descoberta das coisas que nunca vi. . – Osvald de Andrade.

Cada palavra tem seu perfume, sua cor, sua alma. – Maiakovski.

Poesia é uma ou duas palavras e por trás uma imensa paisagem. – Ana Cristina César.

A infância é a poesia da vida. A poesia é a infância do mundo. – Boris Novak.

Uma palavra é um bracelete de encantamentos vocais. – Murray Schafer.

A poesia é o brinquedo das cismas. Os poetas foram crianças sós e pobres que adoravam se divertir com os próprios devaneios, substituindo com vantagens, para o desenvolvimento de sua criatividade, as programações estandardizadas dos jardins de infância e os discutíveis brinquedos pedagógicos, não obstante o primeiro impacto de sua engenhosidade. Entregue a si mesma, sua imaginação recebe e emite aladas mensagens, através do resplendor mágico que anima de gradações de arco-íris o suceder de seus dias. - Cyro Martins, em "Nota sobre Mario Quintana".

O poema é antes de tudo um inutensílio. – Manoel de Barros.

Se procurar bem você acaba encontrando. / Não a explicação (duvidosa) da vida, / Mas a poesia (inexplicável) da vida. – Carlos Drummond de Andrade

Água parada / sonhando na poça / não move moinhos / mas em compensação / mata a sede / dos passarinhos – Hélio Leite.

Hay que podar as metáforas. / hay que tirar o pé das estrofes. / hay que fazer a barba aos ritmos. / hay que tirar o sutiã da lírica. / hay que botar na bunda da poética. / hay que tirar o mofo das rimas. / hay que abrir a porta à loucura. — Sebastião Nunes

Talento e astúcia requerem / a perícia consumada / de falar sem dizer nada / quando não há nada a dizer... – Helena Kolody.

Uma parte de mim / é todo mundo. / Outra parte é ninguém: / fundo sem fundo. / Uma parte de mim / almoça e janta: / outra parte se espanta. / Traduzir uma parte / na outra parte, / que é uma questão / de vida ou morte, / será arte? – Ferreira Gullar.

Página que não / dá poema, / dá pena. – Alice Ruiz.

Cada palavra uma folha / no lugar certo / Uma flor de vez em quando / um ramo aberto / Um pássaro parecia / pousado e perto / Mas não: que ia e vinha / o verso pelo universo – - Cecília Meireles.

Acordei bemol / tudo estava sustenido / sol fazia / só não fazia sentido – Paulo Leminski.

A COISA – A gente pensa uma coisa, acaba escrevendo outra e o leitor entende uma terceira coisa... E, enquanto se passa tudo isso, a coisa propriamente dita começa a desconfiar que não foi propriamente dita. – Mario Quintana.

A poesia não é uma liberação da emoção, mas uma fuga da emoção; não é a expressão da personalidade, mas uma fuga da personalidade. Naturalmente, porém, apenas aqueles que têm personalidade e emoções sabem o que significa querer escapar dessas coisas. - T.S Elliot.

Todas as coisas têm o seu mistério, e a poesia é o mistério de todas as coisas. - Federico Garcia Lorca.

A poesia está guardada nas palavras. – Manoel de Barros.

Um grão de poesia basta para perfumar todo um século. - José Martí

Nós polimos as almas com a lixa do verso. – Maiakovski.

A poesia nos deve surpreender pelo seu delicado excesso e não porque é diferente. Os versos devem tocar nosso próximo, como se ele tivesse lembrado algo que nas noites dos tempos já conhecia em seu coração. A beleza de um poema não está na capacidade que ele tem de deixar o leitor contente. A poesia é sempre uma surpresa, capaz de nos tirar a respiração por alguns momentos. Ela deve permanecer em nossas vidas como o pôr do sol: Algo milagroso e natural ao mesmo tempo. – John Keats.

De tudo o que está escrito, eu amo somente aquilo que o homem escrever com seu próprio sangue. – Nietzsche.

Devemos andar sempre bêbados. Tudo se resume nisto: é a única solução. Para não sentires o tremendo fardo do Tempo que te despedaça os ombros e te verga para a terra, deves embriagar-te sem cessar. Mas com quê? Com vinho, com poesia ou com a virtude, a teu gosto. Mas embriaga-te. E se alguma vez, nos degraus de um palácio, sobre as verdes ervas duma vala, na solidão morna do teu quarto, tu acordares com a embriaguez já atenuada ou desaparecida, pergunta ao vento, à onda, à estrela, à ave, ao relógio, a tudo o que se passou, a tudo o que gemeu, a tudo o que gira, a tudo o que canta, a tudo o que fala, pergunta-lhes que horas são: "São horas de te embriagares!" Para não seres como os escravos martirizados do Tempo, embriaga-te, embriaga-te sem cessar! Com vinho, com poesia, ou com a virtude, a teu gosto. - Charles Baudelaire-1867.

Poesia é a infância reencontrada. – Charles Baudelaire-1867.

O poema é um ser de linguagem, o poeta faz linguagem, fazendo poema. Está sempre criando e recriando a linguagem... Está sempre criando o mundo... a linguagem é um ser vivo... É como uma pessoa que diz sempre que quer ser compreendida. Mas o que ela quer mesmo é ser amada. – Décio Pignatari

Não há poema em si, mas em mim ou em ti. – Otávio Paz

Eu não forneço nenhuma regra para que uma pessoa se torne poeta e escreva versos. E, em geral, tais regras não existem. Chama-se poeta justamente o homem que cria estas regras poéticas. - Maiakóvski

A alegria é a prova dos nove. – Osvald de Andrade.

O que faço nunca me interessa se não comportar alegria. – Maiakovski.

Um poeta é sempre união do vento e da água e deixa seu ritmo por onde passa. - Cecília Meireles.

...........................................................

PS.
Definir é matar, sugerir é criar. – Mallarmé

domingo, 22 de julho de 2007

VARAL VIRTUAL - ALEXANDRE BRITO

UMA VELA À NOSSA SENHORA DA BOA MORTE

a liberdade bastarda se infiltra onde
o céu encontra a terra
denuncia intensa atividade literária

essa idéia no papel derramada assim feito gelatina
nem parece uma idéia parece mais um
estorvo feito de cimento e osso

o sol miúdo sem bolor entesourado e mudo
desonera de rapapés e obrigações um aglomerado de
letras na biblioteca universal dos manuscritos

toda tradição se renova pela libertinagem
a boa nova vem pelo esquecimento intencional das regras
um livro que não descenda de nenhum outro é uma indecência

de sorte que o pecado original da invenção
mais que matar o padre e ir ao cinema
é declarar-se órfã pretender-se sem pai sem par

numa semana ensolarada de 22
um bebê de proveta aproveita a tarde à beira mar
no calçadão desenhado por Niemeyer




O JOGO DAS MIL IMPERFEIÇÕES

o jogo começa sem regras.
um feixe de luz ruga adentro trespassa a pele de um segundo.
um silêncio depois, o silêncio árido. o interstício.
um não-lugar um não sei onde. onde nada ou quase nada
desacontece.

o tempo sinuoso tem o passo lento dos camelos.
não faz evocações a deus algum.
ainda que o criador seja designado em árabe
por quatrocentos e noventa e nove nomes diferentes,
não faz diferença. ninguém é escutado nunca.

amigo dos corvos o espaço é um ser imberbe.
um passeio no deserto nunca é um passeio no deserto.
a sede não cessa com a morte. nem a morte com a salvação.
Bérberes, Beduínos, Tuaregues, bem o sabem, pois as
tempestades de areia não apagam o que com areia se escreve.

mil e uma noites de repouso numa tenda sob o céu à beira do Tigre,
quarenta banhos batismais à luz do dia nas águas do Jordão, não
recompõe o descrente fatigado. um espelho que não reflete, não é
um espelho. quando ninguém sabe dizer com quantos corpos se faz um
cementério, o mundo vertical vem a baixo. sangra em transe a noite possível.

alguém com pouco passado não tem o que dizer.
um poeta demora. ao contrário do profeta sabe a verdade provisória.
nasce sem saber. morre sem saber. e como quem nada sabe
esconde-se atrás das palavras. não para que encontrem-no,
mas às palavras.

tamareiras ensombram o caminho a Bagdá.
o vento milenar sopra sobre a cidade três vezes santa.
dois meninos, órfãos, de etnias distintas,
dois olhos de um mesmo rosto sob o sol
estudam álgebra entre formigas e abelhas.

um sonho encravado na carne é o mundo.

BOA NOTÍCIA BOA NOTÍCIA BOA

Abertas as inscrições para o seminário

A Linguagem dos Pássaros
(O Livro Negro dos Bardos)


Por Marco Celso Huffell Viola

De 7 a 28 de agosto de 2007, às terças, das 19 às 21h
Na Palavraria – Livraria-Café

VARAL VIRTUAL - JAIME MEDEIROS JR

abandono

quando pequeno
pintei em carvão uma pequena casa
esquecida e inabitada
senti toda a tristeza de quem se obrigou a deixá-la
e em meio ao corpo presente da pequena casa re-tratada
senti que toda a ausência que há no mundo
ali estava




pequenos pássaros nos fios de luz lembram
a rua da casa de minha tia em tempos
em que ainda se via o tesourinha

cortando as tristezas de quem via trás
o vidro do quarto de minhas primas mundo

em prima facie e nem se desconfia
do que viria e já se sente saudade



- jaime medeiros jr

sábado, 21 de julho de 2007

VARAL VIRTUAL - RONALDO MACHADO




exercício


no ritmo dos relógios assaltados

percorri os restos da cidade

que se armou de arames e cadeados

erguendo muros de indignidade.


vi pobres velhos endomingados

arrastando os olhos baços da idade

pelas carnes podres dos mercados

na agonia de uma última saudade.


três mulheres de olhos apagados

raspavam a ferrugem da castidade

com a nudez dos lábios escarnados

em ânsias incontidas de reciprocidade.


e na encardida manhã dos condenados

de permeio às areias da sujidade

rompi a digestão dos juízes saciados

mijando nas estátuas da Verdade.

quinta-feira, 19 de julho de 2007

VARAL VIRTUAL - ANDRÉ ARIETA



: :

estática
parede
asma
mar reto
pernas levemente arqueadas
som do ar entrando áspero
antes daquele silêncio
maldizer das coisas
costas batendo na areia
rápido pra direita
corpo solto



- André Arieta
Poeta, roteirista, contista, diretor e produtor, ministra oficinas de roteiro, é frontman, guitarrista e baixista da banda “musical panorama”, produz roteiros para o “cinema 8ito, é curador do “flo” (festival do livre olhar). Ervstkras ilkv suster pral e locktz ivek dadada da da dadada dadadadada.
SAINDO DA GAVETA

depois de tirar dúvidas, mentiras, erotismo,
morte, religiosidade e inocência da gaveta,
o encontro de escritores, atores, etc e tal
apresenta:

SAINDO CRUELDADE DA GAVETA
23 de julho, 19hna Palavraria, Vasco da Gama, 165
Programação:
SIDNEI SCHNEIDER Uns Pezinhos
SILVANE ROMERO Um Peixe Chamado Edryl
PAULO RIBAS Desolação
VIVIANE JUGUERO Fausta
LETÍCIA SCHWARTZ Violência Doméstica
Temas de Agosto: NATUREZA e FOFOCA
Depois: TEXTOS RADIOFÔNICOS e TRADUÇÕES
E ainda: HUMOR e DRAMA.
Informações e inscrições dos textos:
saindodagaveta@hotmail.com
Confira o que já foi lido e debatido:
Parceria: SA Produções FM Cultura
SAINDO DA GAVETA
encontro de escritores, atores, etc e tal – acontece
duas vezes por mês, sempre às segundas, na Palavraria.

quarta-feira, 18 de julho de 2007

Recado da Telma Scherer

Queridos,
Aí vai um convite.

Neste sábado, vou estar apresentando a performance O Rumor da Casa
no espaço Palavraria, às 19h.
A apresentação vai integrar o Sarau do grupo Teia de Poesia.
Quem quiser mais informações sobre o grupo,
acessa www.teiadepoesia.is.dreaming.org.
Quem quiser saber da performance, clica no link www.rumordacasa.blogspot.com.
Lá tem fotos, textos, temperos.
O Palavraria fica na rua Vasco da Gama, 165 Bom Fim.
Fone: (051) 3268-4260. Sábado, dia 21.Às 19h.
A gente sai de lá e vai direto para o sarau do VAIA,
que vai ser no bar Outros 500, às 21h.

Poesia tomando os espaços da cidade.

Abraços,
da Telma.

VARAL VIRTUAL - RAFAEL TROMBETTA

POESIA

LÍRICA
VESTUAL
CAUSAL
CONFLITANTE
LIMITANTE
FRUTÍFERA
SORTIDA
INSTRUMENTO
Meio com o qual verdades são
destiladas ao calor do corações
imantados no cume dos princípios.
Regida pela boa luz que ilumina a natureza.
Sabedoria secular, milenar, universal.
Uma ressonância que ecoa da alma.
O bem, o belo e o justo.
Harmonizam-se com a poesia.
Lúdica, inventiva, atemporal.
Consciente dos fatos.
Vislumbrada pelos acontecimentos.
Coagida pelas leis.
Atacada pelas circunstâncias.
Mantém-se de pé.
Com a guarda em riste.
Abrindo vias para o conhecimento.
Uma forma de contemplação.
Um saudosismo as tradições.
Um elo com o belo.
Um meio para o bem.
Uma forma de justiça.
Um caminho para a sabedoria.
Para sempre, uma arte para a mente.


- Rafael Trombetta,
do grupo Saindo da Gaveta

terça-feira, 17 de julho de 2007


VARAL VIRTUAL - ELISA CARVALHO

PORTO POESIA

Minha nau,
não seguiu a de Cabral
foi adiante
numa terra que não me foi prometida
mas que valia a pena
a estrangeira investida.
Ofereci colares,
troquei meus cocares
depois de uma semana
escrevi ao Rei
se ele leu, eu não sei
mas o que sigo contando,
quando acaba as tempestades
e reina a calmaria
é que continuo navegante de palavras
em meu PortoPoesia.


- Elisa Carvalho
http://www.cenasetemas.blogspot.com/

segunda-feira, 16 de julho de 2007



desenho de James Sebor


VARAL VIRTUAL - SIDNEI SCHNEIDER

DESCANSO

acocado na cascata de cascalho,
o talhador de paralelepípedos,
quieto como um cigarro.

de pedra as vestes
e de pó a pele escura,
quase não se o vê
entregue à paisagem.

acostumado ao plique-plique,
o vale de cipós emudece.

como o rival de dinamite,
o silêncio é insuportável.

senha para o recomeço.


RECOMEÇO

talho a talho vem bulindo
com o osso do minério.

corta em linha o ferro
da pedra, aplacando nos dedos
a carne da montanha.

desesperança não o adoece.

tem paciência de décadas
para encaixar o que produz
no quebra-cabeças da rua.

a montanha é a eternidade.

- Sidnei Schneider, 2007

VARAL VIRTUAL - ZÉ EVANDRO

O Poeta encontra a Poesia

Encontra a poesia o poeta
Que parecia que fazia poesia
Fazia o poeta poesia
Ou a poesia fazia que aparecia

O Poeta
encontra
A Poesia

Agora faz poesia o poeta
E põe azia na poesia que fazia!
E faz o que fazia quando encontrou a poesia
Então parecia que aparecia poesia
Na azia do poeta

- Zé Evandro
faz parte do grupo Serrote Preto

quarta-feira, 11 de julho de 2007

intervenção em pintura de Iman Malek


VARAL POESIA - LUIZ PAULO VASCONCELLOS

Andante com fuoco

Por exemplo. Uma das coisas de que mais gosto
é de ópera. Sofrimento imerecido, vozes sublimes e

maus atores. Quem vai entender a alma humana?



Identificação

Eu sou a cópia.
O original perdeu-se.



A dor

A palavra dói
enquanto constrói
o poema.



- Luiz Paulo Vasconcellos
Comendo pelas beiradas, Tambor Editora, 2006.

sexta-feira, 6 de julho de 2007


VARAL POESIA - ATHAUALPA YUPANQUI

Um poema de Ataualpa Yupanqui
(versão de memória – falta uma estrofe – de E. San Martin, de Nova York)

Tu pensas que te distingues
porque te dizem Poeta
e vives num mundo a parte
muito além destas estrelas

De tanto olhar à lua
nada mais consegues ver
viraste um pobre cego
que não sabe aonde vai

....................................

Venha olhar os mineiros,
os homens nos trigais
e canta ali os que lutam
por um pedaço de pão.

quinta-feira, 5 de julho de 2007


VARAL POESIA - ISAAC STAROSTA

LEMBRANDO MAYSA

- Isaac Starosta

Em Maysa cantando
Acima de tudo
O desespero é calmo

A gente ama
A gente briga
E sai brincando
De ciranda
Numa praça
Da infância

Em Maysa cantando
O desgosto é dengoso
Faz beicinho e passa
Como uma travessura

Maysa segue cantando
Quebra o protocolo
Chora rindo
Num leve tremor
Que vai direto dos lábios
Até a alma dos ouvintes

Maysa vai adiante
Enfrenta o mundo mau
Um mundo pouco-se-me-dá
Pra quem vive em constante
Estado de inspiração

Maysa parou de cantar
Voz trêmula ainda vibrando
E a sala continua tonta
Preguiçosamente submersa
Na tela da TV

segunda-feira, 2 de julho de 2007


VARAL POESIA - MARCIA MAIA

3x4

mais que a lua
em vésperas de cheia
a bruma ilumina a noite
num absurdo e delicioso paradoxo

e eu
nessa quase madrugada
de um inverno ainda incipiente
mínima a fotografo quando escrevo



crash

o ruído de vidro partido
inunda a madrugada

de estilhaços rubros



ofício

um zumbido de sentenças pequeninas
arremedo de palavras quase sílabas
que entre letras esvoaçam suas asas
no alvoroço de buscar o que dizer

entre tédio e rebuliço um sentimento
entrehabita onde o silêncio faz-se círculo
e o percorre — em cada passo o mesmo passo
volta a volta em vã vigília busca a voz

que o exprima que o decifre que alardeie
que desteça a sua teia em mel e ácido
que corrompa a placidez pura do ar

e alça vôo por entre as asas mariposas
que em palavras letras versos voam ávidas
a queimar voz e sentir na mesma luz


- marcia maia
Pernambucana do Recife, médica. Teve seus poemas primeiramente publicados na Revista Poesia Sempre nº15, da Fundação Biblioteca Nacional, em novembro de 2001. Em 2002, seu livro Espelhos foi premiado no 3º Concurso Blocos de Poesia. Participou da Antologia Poetrix (2002), da Antologia Escritas (2004), do Livro da Tribo (2004, 2005 e 2007) , da antologia Poesia do Nascer (2005), editada em Lisboa, Portugal, e ainda da antologia Pernambuco, Terra da Poesia(2005). Publicou quatro livros: Espelhos(2003), um tolo desejo de azul (2003), Olhares/Miradas( 2004) e em queda livre (2005).
Edita os blogues:
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